JÚPITER E O CAMELO
Assim,
procurou Júpiter e, diante dele, começou a queixar-se e lamentar-se:
—
Oh! O quão me é vergonhoso andar assim, sem armadura ou defesa! Porque os
touros armam-se de chifres; os porcos, de dentes; os ouriços, de espinhos; e,
assim, todos os animais, conforme o seu estado. E, sozinho, ando eu sem armas
por estes campos e caminhos, sujeito ao ridículo e ao escárnio de toda a
alimária. Portanto, ó Júpiter — o soberano deus dos deuses —, rogo, suplico e
peço-te que, assim como o touro, dê-me cornos com os quais eu me possa defender,
esquivando-me, destarte, do menosprezo dos outros animais.
Júpiter,
vendo o quão era mal-agradecido o camelo pelo benefício da grandeza, com a qual
a Natureza lhe dotou, tirou-lhe, quase que completamente, as grandes e formosas
orelhas, que lhe conferiam o esplendor. E, sorrindo-se, disse-lhe:
—Porque
não te contentaste com os atributos que a Natureza e a fortuna lhe deram, eu te
retiro as orelhas, para que te recordes, para sempre, deste castigo, e para
que, lamentando-se, e sempre amedrontado, leves a tua vida doravante.
Eis
aqui uma advertência: ninguém deve cobiçar as coisas alheias, para que não
perca o que antes, pacificamente, possuiu.
---
Versão em
português de Paulo Soriano, a partir de tradução anônima espanhola de 1489.
Ilustrações de
autor anônimo do século XVI (Edição de Juan Cromberger, Servilha, 1521).
Nenhum comentário:
Postar um comentário