Havia uma mulher, que tinha uma filha e uma
enteada; estavam sozinhas em casa, uma sempre na casinha, muito maltratada, e a
outra sempre perra e soberba de janela. Passou uma velhinha, e pediu se lhe
davam alguma coisa. Disse a soberba:
— Vá-se embora, tia, que não há pão cosido.
A outra disse:
— Não tenho que lhe dar; só se for este ovo
fresco que pôs agora a galinha.
E deu o ovo à velhinha. A velhinha quebrou-o,
e dentro do ovo estava uma grande pedra preciosa, que era um brilhante; pegou
nele e deu-o à menina:
— Trazei sempre essa pedra ao pescoço, que
enquanto andares com ela haveis de ter todas as felicidades.
A pequena pôs a pedra ao pescoço. A irmã, com
inveja, foi também buscar um ovo, e deu-o à velhinha. Ela disse que o partisse
pela sua mão; assim fez, e rebentou o ovo choco, que tresandava de mau cheiro e
a cobriu de porcaria pela cara e pelas mãos. A velhinha foi-se embora.
Aconteceu passar por ali o rei, e viu aquela menina com a pedra ao pescoço, e
achou-a tão linda, e ficou logo tão apaixonado, que a mandou buscar e casou com
ela. Ficou rainha; e como era boa, a madrasta e a irmã pediram-lhe para que as
deixassem viver no palácio; deixou. Um dia o rei foi para uma guerra, onde
tinha de se demorar; a rainha ficou no palácio. Ora a madrasta, que já sabia do
poder da pedra preciosa, andava mais a filha à mira de ver se lha furtavam; até
que um dia que ela estava no banho, e que a irmã lhe tinha ido botar o lençol,
furtou-lhe a pedra sem ela dar tino. Imediatamente ficou muito aflita, e a irmã
mais a madrasta fugiram para irem ter com o rei, que estava na campanha, porque
tinha a certeza que ele a tomaria por mulher. Pelo caminho puseram-se a
descansar e adormeceram. Passou uma águia e viu luzir a pedra, e de repente
desceu e arrancou-a, e engoliu-a. Quando as mulheres continuaram o seu caminho,
chegaram à barraca do rei, sem terem ainda dado pela falta da pedra. Pediram
licença para entrar, dizendo que era a mulher do rei que vinha visitá-lo,
porque tinha muitas saudades. O rei conheceu quem eram, e mandou-lhes dar muita
pancada e pô-las fora; foi então que a rapariga deu pela falta da pedra, e
botou a fugir, e a mãe atrás dela.
Quando o rei chegou ao seu reino, veio a
rainha ao seu encontro; mas como não tinha a pedra o rei não a conheceu, e
disse: — É uma tola como as outras. E escorraçaram-na. Ela tornou para o
palácio, e lá só a aceitaram para ajudar na cozinha. De uma vez estava-se a
arranjar um grande jantar para o casamento do rei, e ela ao amanhar uma águia,
achou-lhe no papo uma grande pedra preciosa. Guardou-a, e pediu ao dono para ir
servir à mesa. Assim foi; pôs a pedra ao pescoço, e assim que entrou na sala, o
rei conheceu-a e lembrou-se dela, e perguntou-lhe como é que aquilo tinha sido.
Ela contou-lhe tudo, e o rei sentou-a logo à sua direita, e a outra princesa
foi-se embora.
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Ano de publicação: 1883
Origem: Portugal (Porto)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba
Mendes (2021)
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