O JURUPARI E AS MOÇAS
Contam que um velho que tinha três filhas,
combinara com o tio delas para levá-las a apanhar miriti. Conforme tinham
ajustado apareceu de madrugada o Jurupari sob a figura do tio, que ele havia
morto em caminho. Saíram as moças com o suposto tio. Depois de muito
caminharem, perguntou uma delas se ainda estava longe o miritizal. O Jurupari
respondeu que não. À medida que caminhavam, de vez em quando uma delas
perguntava se ainda estava longe o miritizal e ele respondia que não. Ao
alvorecer, já quando estavam perto da gruta, em que morava o Jurupari, uma
delas olhando para os pés deste exclamou: — Kuaá
Yurupari! Este é o Jurupari!
Chegando a casa disse-lhes o Jurupari que ali
é que era o miritizal. Saiu depois, deixando um papagaio de sentinela às moças
para que não fugissem.
Chegando a noite convidou a mais velha para
levar-lhe fogo à rede. Ali começou como morcego a chupá-la. De madrugada tornou
a sair para o mato.
Logo que ele saiu foram as duas irmãs ver a
que dormira com o Jurupari e encontraram somente a sua ossada. À noite chegou o
Jurupari e mandou a segunda levar-lhe fogo à rede e quando esta se aproximou
agarrou-a e chupou a como a primeira. Pela madrugada foi novamente para o mato.
Quando este saiu a mais nova foi à rede e viu a outra ossada. Chorando
deitou-se na rede junto dos ossos de suas irmãs. Logo depois viu passar voando
sobre a gruta o Carão e gritou:
— Ah! Carão! Carão! Se tu fosses gente me
levarias a minha mãe!
Dali a pouco apareceu-lhe o Carão sob a forma
de um moço, que lhe disse que tomasse os ossos, um pouco de sal e de cinzas e
fosse furtar a milonga do Jurupari.
Logo que ela arranjou tudo partiram.
Apenas saíram começou o papagaio a gritar:
— Ce
yara, Karan o raçô ana ne yapuruchitá. — (Meu senhor, lá vai o Carão levando o teu
caramujo.)
Ouvindo isso correu atrás deles o Jurupari
gritando:
— U rure Karan ce muyrakytan. (Carão
traz o meu talismã.)
Ao aproximar-se o Jurupari, o Carão disse à
moça que tomasse um dos ossos das irmãs.
Imediatamente levantou-se uma grande fumaceira
que impediu o Jurupari de aproximar-se.
Aproveitaram-se disso e caminharam. Já tinham
andado muito quando novamente ouviram o grito:
— U rure Karan ce muyrakytan.
O Carão mandou então queimar sal e cinza, o
que fez com que se levantasse um grande espinhal. Enquanto o Jurupari se
desembaraçava dos espinhos eles avançaram. Já perto da casa da mãe ouviram
ainda:
— U rure Karan ce muyrakytan!
Mandou então o Carão que queimasse juntos os
ossos, o sal e as cinzas, o que fez com que aparecesse um grande rio que o
Jurupari não pode atravessar e assim puderam chegar à casa da mãe, que ficou
contente por ver as filhas, quando as julgava todas perdidas.
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Ano de publicação: 1890.
Origem: Brasil (Amazonas)
Pesquisa e adequação ortográfica:
Iba Mendes (2021)
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