O GRANDE ARTISTA
CONDENADO À MORTE
Era uma vez um pobre homem que, por qualquer
delito grave, foi condenado à morte.
Quando estava na prisão, e já no oratório,
para no dia seguinte ir para a forca, não se cansava de bradar:
— Matam-me; matam-me de certeza!...
Mas se soubessem o grande Artista que vão
matar, eles me perdoariam!... Quando já não houver nenhum remédio, chorarão um
Artista como não há outro! Vou morrer! Vou a enforcar! Deixá-lo. Pior mal será
para eles, que perdem um Artista como nunca houve!...
Os guardas, intrigados com aquele palavreado,
foram perguntar-lhe qual era a sua Arte.
— Depois de eu morrer saberão o que se perde
comigo!... Artistas destes não vêm muitos ao Mundo! Eu sou enforcado, e já não
padeço mais. Mas o País perde um Artista sem rival!...
Os guardas foram dizer ao Rei o que era
passado, e ele incumbiu-os de interrogarem o condenado e conseguirem saber qual
era a sua Arte, pois, se na verdade a morte dele fosse uma perda para a Nação,
perdoaria o crime.
Quando os guardas lhe disseram o que decidira
o Rei, o preso respondeu com o mesmo alarido:
— Isso é que nunca! O que a Nação perde sei
eu muito bem, mas não digo mais nada. Dizê-lo?! Era o que vocês queriam, para
ficarem com o meu segredo e me matarem na mesma! Só depois da minha morte o hão
de saber! Só depois é que terão de arrepender-se do que fazem!...
— Mas Sua Alteza quer dar-te o perdão, se tu
disseres a Arte que tens. E palavra de Rei não volta atrás.
— Só direi a minha Arte depois de ter nas
mãos o perdão assinado por Sua Alteza. Não quero saber de promessas. Palavras
leva-as o vento... E eu não dou de graça a minha Arte a ninguém!...
Voltaram os guardas ao palácio onde estavam
os Reis, já muito intrigados, e repetiram quanto o homem apregoava dos seus
méritos, e a sua decisão de só dizer qual era a sua grande Arte depois do
perdão assinado.
A Rainha, cheia de curiosidade, e mais
inclinada para a clemência, pediu ao Rei que assinasse o perdão, pois não devia
perder-se um Artista que podia honrar o País.
O Rei convenceu-se, e assinou o perdão que
libertava o grande Artista. E confiou a carta de perdão aos guardas, que
voltaram à prisão onde o condenado continuava os seus proclames:
— Mal sabem o grande Artista que se perde!...
Matem-me, que depois terão de chorar a minha falta!... Mas já não haverá
remédio!...
Nisto os guardas entraram no oratório onde
ele estava e entregaram-lhe a carta do perdão real.
Quando a teve nas mãos o homem deu um pulo de
contente. Beijou a assinatura do Rei e dirigiu-se para a porta disposto a sair
para a liberdade, sem mais cuidados. Mas os guardas não o deixaram ir-se embora
sem que ele cumprisse a obrigação em que estava de, finalmente, dizer o seu
valor e declarar a Arte maravilhosa que se perderia para sempre com a sua morte
na forca.
Então o perdoado voltou-se para os guardas,
muito sério, e disse:
— O que era a minha Arte?! Era muito boa. Meu
pai fazia cortiços, e era eu quem os barrava!
Todos os presentes desataram a rir. E como o
grande Artista já tinha o perdão real, nada puderam fazer-lhe e deixaram-no ir
em paz, e salvo afinal, com muita arte, da morte a que fora condenado.
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Origem: Portugal.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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