Era uma vez um homem que tornou a casar, e
tinha uma filha do primeiro casamento que era tratada pela madrasta mal a mais
não poder. Tinham uma figueira lampa no quintal, para onde a madrasta mandava a
enteada guardar os figos por causa da passarada. Quando a pequena ia para o
campo, a madrasta seguia-a também para contar os figos, dizendo-lhe que a
matava se lhe faltasse algum. Um dia veio o milhano e comeu três figos, por
mais que a pequena o enxotasse. Quando estava já a anoitecer a madrasta veio
revistar a figueira, e deu pela falta de três figos. Logo ali matou a enteada e
a enterrou debaixo da figueira, e veio para casa dizendo que a rapariga tinha
fugido. O pai pensou que ela teria ido servir para alguma casa longe. Um dia
que o pai passava por debaixo da figueira, ficou pasmado de ver debaixo dela
muitas flores, e entre elas um lindo botão de rosa. Foi para as colher, mas
sentiu uma voz, a dizer-lhe:
Não me arranquem os meus cabelos,
Que minha mãe os criou,
Minha madrasta mos enterrou
Pelo figo da figueira
Que o milhano levou.
Ao princípio o homem ficou sem saber o que
havia de fazer; mas por fim resolveu-se a fazer uma cova naquele lugar, para
ver que coisa era. Depois de estar já bem funda a cova, descobriu uma lajem,
levantou-a, e deu com uma escadaria por onde desceu. Quando chegou lá abaixo
encarou com a filha, que estava muito linda e muito bem vestida:
— Filha, como é que vieste ter aqui?
— Quando a minha madrasta me enterrou,
apareceu-me aqui esta casa, e todos os dias vem aqui uma senhora dar-me de
comer.
O pai ficou vivendo com a filha, e não quis
mais saber da mulher.
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Ano de publicação: 1883
Origem: Portugal (Algarve)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba
Mendes (2021)
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