André, o bom Andrezinho, menino querido e estimado por todos que o conheciam, achava-se desesperado, banhado em lágrimas, aflito, porque sabia que o seu extremoso pai estava nos paroxismos finais da vida.
Só ele velava no pequeno e desguarnecido aposento
onde jazia o moribundo. A lamparina acesa derramava amortecida claridade. Era
noite alta.
De súbito, o velho, quebrando o silêncio,
falou:
— Sempre foste bom filho, André, e, por isso
Deus te ajudará na tua peregrinação pela terra.
Depois, olhou tristemente o filho, pela
última vez; fechou os olhos para sempre e expirou. Estava morto, mas parecia
dormir apenas um sono doce, calmo, tranquilo, porque morrera serenamente, como
um justo, que sempre fora.
André, compreendendo a terrível realidade, chorava
amargamente. Ajoelhado junto à cama, tendo entre as suas as mãos do seu amado
morto, beijando-as com todo respeito, deixou-se ficar na mesma posição, sempre
a chorar, até que, vencido pelo sono, exausto de fadiga, adormeceu.
Sonhou. Viu o Sol e a Lua inclinarem-se
diante dele. Viu o velho, de perfeita saúde, sorrindo-se, alegre como outrora,
nos seus dias de bom humor. Uma encantadora mocinha, tendo uma coroa de ouro
sobre a bela cabeça ornada de louros cabelos, estendia-lhe a mão, enquanto seu
pai lhe dizia: “Eis tua noiva, André. É a moça mais formosa do mundo
inteiro”.
O menino despertou.
A agradável e radiante visão havia
desaparecido. Ninguém se achava a seu lado: no quarto, só estavam ele e o
cadáver.
No dia seguinte enterraram o morto. André
acompanhou tristemente o enterro, lembrando-se que nunca mais havia de ver
aquele a quem ele tanto amara, e por quem tanto fora amado. Ouviu o som da
terra caindo sobre o caixão; ouviu os cantos suavíssimos das preces rezadas. E
chorou. As lágrimas fizera-lhe bem, aliviando-o.
Olhou em torno de si. O sol brilhava
majestosamente, dourando as árvores verdejantes, como se quisesse dizer-lhe:
“Consola-te, Andrezinho, contempla este céu, tão azul, tão sereno! É nele que
está teu pai rogando a Deus para que sejas eternamente feliz.”
E, ali mesmo, no cemitério, o mocinho
protestou consigo mesmo:
— Prometo que serei sempre bom, porque quero
reunir-me, um dia, a meu pai, que está no céu.
Em seguida, tendo ajoelhado e rezado mais uma
vez, no sepulcro do seu querido morto, retirou-se para casa, ainda triste,
porém, resignado, consolado.
***
Alguns dias mais tarde, André resolveu
abandonar a sua aldeia natal, para correr mundo em busca de trabalho.
Firmemente resolvido a executar esse projeto,
arrumou a sua trouxa, vendeu as poucas coisas que o velho deixara, conseguindo
reunir apenas cinquenta mil-réis, e pôs-se a caminho, tendo ido primeiro ao
cemitério despedir-se do seu querido morto.
Por muitos e muitos dias caminhou ele, sempre
em frente, atravessando planícies, montes, vales, florestas e aldeias.
Por toda a parte, onde quer que chegasse,
todos o acolhiam efusivamente, simpatizando à primeira vista com a sua
fisionomia expansiva, leal, franca, honesta. E ninguém lhe recusava
hospedagem.
Outras vezes, porém, longe dos povoados,
quando a noite baixava, dormia ao deus-dará, quer em pleno campo, ao relento,
quer abrigado em algum velho tronco de árvore anosa. Não receava as feras, os
animais, os bichos venenosos, acolhendo-se sob a proteção de Deus.
Um dia jornadeava ele por uma extensa
campina. Ao cair da tarde o tempo mudou bruscamente; enfarruscou-se o céu,
coberto de grossas nuvens negras. Ameaçava chuva. Trovões ribombavam.
Relâmpagos cruzavam-se nos ares.
Ao longe, muito longe, erguida sobre um
pequeno outeiro, alvejava uma capelinha.
André correu para ela; e, vendo a porta
aberta, entrou, para fugir ao temporal, que acabava de desabar.
Ajoelhou-se a um canto, fez a sua oração e
adormeceu.
Pelo meio da noite, despertou. A tempestade
cessara. A noite tornara-se calma. Pela porta aberta, o luar entrava,
iluminando a igrejinha.
Foi só então que o rapaz reparou: no centro
da nave estava um esquife aberto, com um cadáver, que não haviam tido tempo de
inumar. Não teve medo porém, pois sabia que os mortos não voltam; e que só os
vivos fazem mal, quando são maus.
Depois de fazer uma breve oração, por alma
daquele finado, ia de novo adormecer, quando ouviu barulho de passos. Ato
contínuo, entraram dois homens: dirigiram-se para o caixão, e fizeram menção de
carregar o corpo.
— Que querem os senhores com esse morto?
perguntou o mocinho, intervindo. Deixem-no em paz, pelo amor de Deus!...
— Não, respondeu um dos dois malfeitores:
Vamos atirá-lo fora, para servir de pasto aos urubus, porque ele nos devia
dinheiro e morreu sem nos pagar.
— Ignoro a quanto montava a dívida, disse o
moço. Toda a minha fortuna é cinquenta mil-réis. De bom grado lhos darei, se os
senhores prometerem que não exercerão tão mesquinha vingança.
— Pois sim, concordaram os dois perversos. Já
que o senhor paga por ele, deixa-lo-emos apodrecer sossegadamente.
André deu-lhe o dinheiro, e os malvados
retiraram-se.
Ao amanhecer, o generoso mocinho saiu da
igreja, e prosseguiu na jornada, embrenhando-se numa floresta que viu em
frente.
Tendo-a atravessado, ao cabo de alguns
minutos encontrou um rapaz, pouco mais ou menos de sua idade, que lhe
perguntou:
— Para onde se dirige você, camarada?
— Vou por esse mundo em fora, até encontrar
trabalho, respondeu Andrezinho.
— Então vamos juntos, que eu sigo o mesmo
destino, disse o outro. E perguntou em seguida: como te chamas?
— André... e tu?
— Miguel.
Os dois moços caminharam lado a lado, ambos
alegres, ora rindo, ora cantando, conversando, despreocupados dos prazeres da
vida e das fadigas da jornada.
Era dia alto, quando pararam para almoçar, à
sombra de uma frondosa árvore, dividindo irmãmente o farnel que cada um
trazia.
Pouco depois viram passar, a alguma distância
do lugar em que se achavam, uma velhinha, muito velha, encarquilhada e trêmula,
carregando um molho de lenha que havia catado na floresta. Curvada àquele peso,
a custo caminhava a pobrezinha.
De súbito, a velha escorregou, e caiu no
chão, soltando gritos lamentosos. Os dois companheiros correram prontamente em
seu socorro, tentando levantá-la. Viram porém, que a infeliz havia fraturado
uma das pernas.
André propôs carregá-la até a casa, mas
Miguel sossegou-o. Tirou do bolso uma pomada, esfregou no lugar fraturado, e a
velhinha depressa ficou curada, como se nada houvesse sofrido.
Querendo pagar o relevante serviço que Miguel
acabava de lhe prestar, a velha presenteou-o com três varinhas verdes que
colhera, dizendo-lhe que eram preciosíssimas.
Sorriu-se André, vendo a insignificância do
presente, mas Miguel guardou-as com o máximo cuidado, pois sabia que virtude
continham, e de que maneira se serviria delas.
Os dois amigos caminharam o dia inteiro; e
quando a noite desceu, repousaram ao luar, sem cama, nem travesseiros, ao ar
livre, mas assim mesmo satisfeitos.
Rompeu a aurora. Pelo meio-dia, seguindo por
extenso campo a perder de vista, sob um sol causticante, os dois companheiros
encontraram um soldado caído, sem fala, exausto de forças, semimorto.
Miguel tirou do seu saco de viagem um vidrinho,
abriu com uma faca os dentes cerrados do soldado, e fê-lo engolir algumas gotas
do líquido – uma água vermelha, que o frasco continha. Imediatamente o militar
voltou à vida: comeu um pedaço de pão e queijo, que lhe ofereceu André; e pode
marchar.
Querendo testemunhar ao generoso Miguel o seu
reconhecimento, obrigou-o a aceitar a espada que trazia; e despediu-se
deles.
À tarde jornadeavam ainda os rapazes, quando
ouviram nos ares os sons deliciosos de uma doce música. Levantaram a cabeça, e
viram um grande cisne branco, que cantava... cantava... enfraquecendo
gradualmente a voz... voando cada vez menos... descendo... descendo... até cair
morto, junto aos dois companheiros de viagem.
Miguel, vendo-o morto, servindo-se da espada
que lhe dera o soldado a quem socorrera, cortou-lhe as asas, dizendo para o seu
camarada:
— Estas asas valem ouro, meu amigo. Vou
levá-las.
E meteu-as no saco, em companhia das três
varinhas da velha e do sabre do soldado.
***
Passados dois dias mais, chegaram finalmente
a uma grande e populosa cidade, que souberam ser a capital do reino de
Mogador.
Pernoitando numa hospedaria, informaram-se
com o hoteleiro dos usos e costumes da terra.
Souberam que o rei Íris IV era excelente
príncipe, dotado de bom coração, o que não sucedia, porém, com a princesa
Lucília.
Essa moça, extraordinariamente formosa,
causando pasmo a todas as pessoas que a viam, um só minuto que fosse, era
cruel, era má, era perversa.
O rei querendo casá-la, ela permitiu a todo
mundo pretender-lhe a mão, quer fosse fidalgo ou plebeu, milionário ou mendigo,
sob a condição de adivinhar, em três dias consecutivos, no que estaria ela
pensando no momento de falar ao pretendente. Se a pessoa adivinhasse,
desposá-la-ia, vindo a reinar por morte do pai; se não adivinhasse, morreria
enforcada na praça pública.
Mais de dois mil rapazes, de todas as
classes, de todas as partes do globo, haviam se sujeitado a tais condições, mas
nem um só conseguira adivinhar-lhe os três pensamentos.
E Lucília, bárbara, impiedosa, sem coração,
não tivera pena de um só, mandando enforcá-los todos.
Íris IV afligia-se com aquilo, mas nada podia
fazer. O povo também sofria.
André ficou horrorizado, ouvindo a narração
daquelas atrocidades: e amaldiçoava a princesa, opinando que devia ser
açoitada, para castigo da sua maldade.
Ainda estava sob tão desagradável impressão, quando ouviu na rua grande rumor de gritos, exclamações, hurras e vivas. Correu à janela. Era a princesa Lucília, que passava montada a cavalo, e o povo aplaudiu-a, subjugado pela sua extrema beleza, todas as vezes que a avistava.
Mal a viu, André empalideceu. Era a visão,
que vira em sonhos, no dia da morte de seu pai. Ficou alucinado. Esqueceu tudo
quanto acabavam de lhe contar, para amá-la, amá-la doidamente,
apaixonadamente.
Desde esse momento, tomou a resolução
inabalável de se apresentar candidato à sua mão. Debalde o hoteleiro, que logo
com ele simpatizara, lhe repetiu que a princesinha, por demais perversa, não
tinha coração, espalhando-se mesmo a lenda de que era uma feiticeira, auxiliada
pelo Diabo. Debalde o seu companheiro de viagem tentou dissuadi-lo daquela
terrível ideia.
André não os atendeu. Na manhã seguinte,
vestiu-se o melhor que pôde, e encaminhou-se para o paço, pedindo uma audiência
ao rei.
Assim que o soberano viu aquele moço, formoso, simpático, alegre, atraente, e soube que se apresentava como candidato à mão de sua filha, ficou desesperado. Contou-lhe com a máxima franqueza qual era o caráter da maldosa princesinha, e mostrou-lhe num dos jardins reais, esqueletos sem conta dos pretendentes.
Não conseguiu, porém, fazê-lo mudar de resolução.
Então, o velho monarca mandou chamar Lucília,
apresentou-lhe André, que ao vê-la mais apaixonado ficou.
Marcou-lhe o dia seguinte para a primeira
prova de adivinhação.
***
Na cidade, a consternação era geral.
Lastimavam todos a sorte do belo e amável estrangeiro, pois ninguém duvidava
que havia de ser fatalmente vítima da maldade de Lucília. Fizeram-se preces
públicas. Fecharam-se os teatros: nem um só divertimento público funcionou.
Toda a gente trajava luto.
Ele era o único que se conservava calmo,
contando que Deus o auxiliaria no momento da adivinhação.
À noite deitou-se tranquilo, como costumava,
depois de ter feito as suas orações, e não tardou em adormecer.
Miguel, também, deitou-se em outra cama, no
mesmo quarto da estalagem, e fingiu que dormia. Assim, porém, que viu o
companheiro ferrado no sono, levantou-se sorrateiramente. Abriu o seu saco de
viagem, apanhou as duas asas do cisne que matara, e colocou-as nas espáduas,
bem grudadas, muniu-se de uma das três varinhas que lhe dera a velha da
floresta; e, tornando-se invisível, voou pelos ares, em direção ao palácio de
sua majestade el-rei Íris IV, soberano de todo o vastíssimo país de Mogador e
terras circunvizinhas.
Aí esperou algum tempo. Pouco depois, viu
abrir-se uma das janelas dos aposentos da princesa, e ela aparecer, voando com
asas pretas, envolta num grande véu de filó alvíssimo.
Miguel, sempre invisível, voou acompanhando-a,
mas a fustigá-la com a varinha, sem piedade.
Longa foi a viagem pelos ares, até que
finalmente chegaram a uma gruta que havia no meio da mata. Morava aí o horrível
feiticeiro Barraguzão, que era o padrinho de Lucília.
A moça, tendo entrado, contou-lhe o que se
havia passado: a chegada do novo pretendente, a vinda dela pelos ares,
sentindo, entretanto, que a açoitavam. Pediu-lhe conselho como responderia no
outro dia, por ocasião da audiência.
O infame bruxo explicou-lhe que as pancadas que ela sentira eram da neve, caindo; e recomendou-lhe que, no momento em que André se apresentasse para lhe adivinhar o pensamento, pensasse numa coisa muito simples. E combinaram que seria nas botinas dela.
Lucília despediu-se; e voltou, voando pelos
espaços, sempre seguida de Miguel, que invisivelmente, não cessou de
chicoteá-la, até chegarem ao palácio.
O misterioso companheiro, deixando a moça
entrar, voltou para a hospedaria; desgrudou as asas, que guardou
cuidadosamente, e deitou-se, sem que Andrezinho houvesse dado por falta
dele.
Este acordou cedo, e começou a vestir-se, sem
se preocupar sequer com a sorte que lhe estaria reservada se não adivinhasse o
pensamento da princesa. Todo entregue à sua paixão, só pensava em Lucília,
amando-a cada vez mais.
Quando ia saindo para o palácio, para se
submeter à primeira prova, ainda não havia decidido como responder.
Então, Miguel chamou-o e aconselhou-o:
— Olha, André, naturalmente a princesa para
te desnortear, há de pensar numa coisa muito simples. Assim, acho que deves
lembrar de um dos objetos de seu vestuário: nas botinas, por exemplo.
— Pois sim, respondeu ele. Direi que é nas
botinas que ela está pensando.
No momento solene da audiência, perante a
corte reunida, em presença do rei e dos grandes dignatários do reino, André
compareceu. Lucília, lá estava, deslumbrante de beleza, mocidade e graça,
sentada num trono de ouro e marfim.
— Então, em que estou pensando?
— Nas botinas de vossa alteza, respondeu o
moço.
A princesa ficou desapontada, mas não teve remédio senão confessar que era verdade. Entretanto não desanimou, recordando-se que ainda faltavam duas provas, não sendo provável que o pretendente se saísse tão bem em ambas.
***
André passou o dia inteiro satisfeitíssimo, e
assim todo o povo. Já tinham alguma esperança que o jovem estrangeiro pudesse
adivinhar os outros dois pensamentos.
À noite, o rapaz deitou-se calmamente,
confiando em Deus. Logo que o viu adormecido, Miguel levantou-se devagarinho,
como fizera na véspera, apanhou outra vez as asas do cisne e a segunda das três
varas que lhe dera a velhinha da floresta.
Repetiu-se ponto por ponto a cena da noite
anterior. O misterioso companheiro de viagem, voando invisivelmente pelos
espaços, acompanhou Lucília, fustigando-a sempre, até a caverna do horrível
bruxo.
Aí, narrou Lucília o que se tinha passado, e
Barraguzão, o feiticeiro, aconselhou-a a que se pensasse nas luvas.
Miguel, o que tudo ouvira, ao despertar disse
a André que havia sonhado toda a noite com a princesinha e suas luvas, e pois
aconselhava-o a que se referisse a elas, quando lhe perguntasse em que estava
pensando.
O moço obedeceu, e Lucília quase morreu de
dor, vendo-o adivinhar pela segunda vez o seu pensamento.
A população estava em delírio, sabendo que
havia sido coroada de bom êxito a segunda prova. Fizeram-se deslumbrantes
festas, para comemorar o acontecimento.
***
Na terceira noite, André dormiu calmo e
sereno, como nas precedentes, e Miguel levantou-se sem barulho. Abriu o seu
saco de viagem; grudou nas omoplatas as duas asas brancas do cisne; muniu-se da
terceira e última varinha com que o brindara a velha da floresta; pôs à cinta à
espada do soldado que socorrera; e, descerrando a janela, voou em direção ao
palácio real.
Pouco depois, do mesmo modo que nas noites
anteriores, apareceu Lucília, e ambos, Miguel – sempre invisível, açoitando-a
sem cessar – voaram para a caverna do feiticeiro.
Longa foi a confabulação. A princesa estava
desesperada, porque André já tinha adivinhado duas vezes seguidas, e podia
sair-se bem da terceira.
O bruxo, porém, sossegou-a:
— Não! ele tem acertado porque tens pensado
em coisas simples. Amanhã pensarás em minha cabeça. O estrangeiro não me
conhece, naturalmente não sabe sequer que existo, e assim perderá.
Lucília, muito satisfeita, aceitou o
conselho: e partiu para o palácio.
Miguel deixou-a sair; e, vendo-se só com
Barraguzão, puxou da espada, e, de um golpe, lhe decepou a cabeça. Embrulhou-a
num lençol, e voou para a estalagem.
À hora da audiência, André pediu-lhe conselho
como deveria responder, vendo o bom êxito das duas primeiras vezes.
Então Miguel deu-lhe o embrulho, contendo a
cabeça do feiticeiro, recomendando que só o abrisse no instante em que a
princesa lhe perguntasse no que estava ela pensando.
O moço executou fielmente o que mandara o seu
misterioso amigo.
Lucília, mal avistou a cabeça do bruxo,
compreendeu tudo, mas não teve remédio senão receber o estrangeiro como
esposo.
Celebraram-se imponentíssimos festejos para a
realização do casamento. O povo inteiro exultou de alegria.
Entretanto a formosa princesa, perversa como
era, não amava o noivo.
Foi ainda Miguel que o socorreu. Deu-lhe um
frasquinho contendo um precioso líquido cor de ouro, recomendando-lhe que o
misturasse no chá de Lucília, na noite do casamento.
A moça, ao bebê-lo, sentiu uma grande dor no
peito, mas ao mesmo tempo olhou terna e amorosa para o esposo.
Lucília amava pela primeira vez na vida, e
continuou a amar. Estava quebrado o encanto.
No dia seguinte, Miguel apareceu ao
companheiro, e disse-lhe:
— Eu sou a alma daquele morto, a quem não
consentiste que dois perversos atirassem no campo para servir de pasto aos
urubus. Com o único dinheiro que possuías, compraste a minha tranquilidade no
túmulo. Porque foste bom, Deus te protegeu.
Agora minha missão está finda.
Sê feliz!
Acabando de pronunciar tais palavras,
transformou-se em luminosa nuvenzinha, e desapareceu nos ares.
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Ano de publicação: 1896.
Origem: Brasil (Reconto)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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