Havia um homem que era carvoeiro, e não
gostando daquela vida, meteu-se a ser adivinhão. Foi ter à corte do rei, e
disse que tinha ofício de adivinhar. Ora na corte tinha-se feito por aqueles
dias um grande roubo, e o rei queria descobrir os criminosos; mandou vir João
Ratão à sua presença, e perguntou-lhe quanto queria para adivinhar quem eram os
ladrões. Respondeu o João Ratão que queria que o rei lhe desse três jantares
primeiramente. O rei mandou pôr uma mesa com bastantes iguarias, e os criados
do palácio começaram a servir o adivinhão. Assim que João Ratão acabou de comer
o primeiro jantar, pôs-se a tocar rufo com o garfo e a faca no prato, dizendo
muito contente:
— O primeiro já cá está! O primeiro já cá
está!
Um dos criados que o servira, ouvindo o que
João Ratão dizia, entendeu que era consigo, e que ele tinha adivinhado que
estava ali um dos ladrões. Ao outro dia João Ratão comeu um segundo jantar, e
tornou a bater com o garfo e faca, cantando:
— O segundo já cá está! O segundo já cá está!
O criado tinha pedido a um companheiro que
fosse servir o adivinhão em lugar dele, e este outro percebendo que estava tudo
descoberto botou-se de joelhos aos pés de João Ratão confessando tudo, e
dizendo-lhe quem eram os outros companheiros, mas que só ele é que podia fazer
com que o rei lhes perdoasse. João Ratão descobriu ao rei quem eram os ladrões,
e ficou muito acreditado na corte. O rei não o quis mais deixar ir embora, e
disse que lhe ia propor uma adivinha; se ele a soubesse explicar, daria-lhe a
mão da princesa, e se não acertasse o mandaria matar.
João Ratão ficou triste como quem via já o
fim da sua vida; comeu à mesa com o rei. No fim do jantar trouxeram-lhe um copo
cheio de mijo de porca, e ele bebeu. Perguntou-lhe então o rei:
— Adivinha o que é que agora bebeste!
João Ratão ficou todo atrapalhado, porque
sabia que desta não escapava, e disse:
— Aqui é que a porca torce o rabo.
O rei ficou muito admirado dele ter
adivinhado, e cumpriu a palavra dando-lhe a princesa em casamento. Foi o que
ganhou o João Ratão, deixando-se de carvoeiro para ser adivinhão.
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Ano de publicação: 1883
Origem: Portugal (Coimbra)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba
Mendes (2021)
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