BRANCA DE NEVE
Um dia, a rainha de um reino bem distante
bordava perto da janela do castelo, uma grande janela com batentes de ébano,
uma madeira escuríssima. Era inverno e nevava muito forte. A certa altura, a
rainha desviou o olhar para admirar os flocos de neve que dançavam no ar; mas
com isso se distraiu e furou o dedo com a agulha.
Na neve que tinha caído no beirai da janela
pingaram três gotinhas de sangue. O contraste foi tão lindo que a rainha
murmurou:
— Pudesse eu ter uma menina branquinha como a neve, corada como sangue e com os cabelos negros como o ébano...
Alguns meses depois, o desejo da rainha foi
atendido. Ela deu à luz uma menina de cabelos bem pretos, pele branca e face
rosada. O nome dado à princesinha foi Branca de Neve.
Mas quando nasceu a menina, a rainha morreu.
Passado um ano, o rei se casou novamente. Sua esposa era lindíssima, mas muito
vaidosa, invejosa e cruel.
Um certo feiticeiro lhe dera um espelho
mágico, ao qual todos os dias ela perguntava, com vaidade:
— Espelho, espelho meu, diga-me se há no
mundo mulher mais bela do que eu.
E o espelho respondia:
— Em todo o mundo, minha querida rainha, não
existe beleza maior.
O tempo passou. Branca de Neve cresceu, a
cada ano mais linda... E um dia o espelho deu outra resposta à rainha.
— A sua enteada, Branca de Neve, é agora a
mais bela. Invejosa e ciumenta, a rainha chamou um de seus guardas e lhe
ordenou que levasse a enteada para a mata e lá a matasse. E que trouxesse o
coração de Branca de Neve, como prova de que a missão fora cumprida.
O guarda obedeceu. Mas, quando chegou à mata,
não teve coragem de enfiar a faca naquela lindíssima jovem inocente que,
afinal, nunca fizera mal a ninguém. Deixou-a fugir. Para enganar a rainha,
matou um veadinho, tirou o coração e entregou-o a ela, que quase explodiu de
alegria e satisfação.
Enquanto isso, Branca de Neve fugia,
penetrando cada vez mais na mata, ansiosa por se distanciar da madrasta e da
morte.
Os animais chegavam bem perto, sem a atacar;
os galhos das árvores se abriam para que ela passasse.
Ao anoitecer, quando já não se aguentava mais
em pé de tanto cansaço, Branca de Neve viu numa clareira uma casa bem pequena e
entrou para descansar um pouquinho.
Olhou em volta e ficou admirada: havia uma
mesinha posta com minúsculos sete pratinhos, sete copinhos, sete colherezinhas
e sete garfinhos. No cômodo superior estavam alinhadas sete caminhas, com
cobertas muito brancas.
Branca de Neve estava com fome e sede.
Experimentou, então uma colher da sopa de cada pratinho, tomou um gole do vinho
de cada copinho e deitou-se em cada caminha, até encontrar a mais confortável.
Nela se ajeitou e dormiu profundamente.
Os donos da casa voltaram tarde da noite;
eram sete anões que trabalhavam numa mina de diamantes, dentro da montanha.
Logo que entraram, viram que faltava um pouco
de sopa nos pratos, que os copos não estavam cheios de vinho... Estranho.
Lá em cima, nas camas, as cobertas estavam
mexidas... E na última cama — surpresa maior! — estava adormecida uma linda
donzela de cabelos pretos, pele branca como a neve e face vermelha como o sangue.
— Como é linda! — murmuraram em coro.
— E como deve estar cansada — disse um deles
—, já que dorme assim.
Decidiram não incomodar; o anão dono da
caminha onde dormia a donzela passaria a noite numa poltrona.
Na manhã seguinte, quando despertou, Branca
de Neve se viu cercada pelos sete anões barbudinhos e se assustou. Mas eles
logo a acalmaram, dizendo-lhe que era muito bem-vinda.
— Como se chama? — perguntaram.
— Branca de Neve.
— Mas como você chegou até aqui, tão longe,
no coração da floresta?
Branca de Neve contou tudo. Falou da
crueldade da madrasta, da sua ordem para matá-la, da piedade do caçador que a
deixara fugir, desobedecendo à rainha, e de sua caminhada pela mata até
encontrar aquela casinha.
— Fique aqui, se gostar... — propôs o anão
mais velho.
— Você poderia cuidar da casa, enquanto nós
estamos na mina, trabalhando.
Mas tome cuidado enquanto estiver sozinha.
Cedo ou tarde, sua madrasta descobrirá onde você está, e se ela a encontrar...
Não deixe que ninguém entre! E mais seguro.
Assim começou uma vida nova para Branca de
Neve, uma vida de trabalho.
E a madrasta? Estava feliz, convencida de que
beleza de mulher alguma superava a sua. Mas, um dia, teve por acaso a ideia de
interrogar o espelho mágico:
— Espelho, espelho meu, diga-me se há no
mundo mulher mais bela do que eu.
E o espelho respondeu com voz grave:
— Na mata, na casa dos mineiros, querida
rainha, está Branca de Neve, mais bela que nunca!
A rainha entendeu que tinha sido enganada
pelo guarda: Branca de Neve ainda vivia! Resolveu agir por si mesma, para que
não houvesse no mundo inteiro mulher mais linda do que ela.
Pintou o rosto, colocou um lenço na cabeça e
irreconhecível, disfarçada de velha mercadora, procurou pela mata a casinha dos
anões. Quando achou, bateu à porta e Branca de Neve, ingenuamente, foi atender.
A malvada ofereceu-lhe suas mercadorias, e a princesa apreciou um lindo cinto
colorido.
— Deixe-me ajudá-la a experimentar o cinto.
Você ficará com uma cintura fininha, fininha — disse a falsa vendedora, com uma
risada irônica e estridente, apertando cada vez mais o cinto.
E apertou tanto, tanto, que Branca de Neve se
sentiu sufocada e desmaiou, caindo como morta. A madrasta fugiu.
Pouco depois, chegaram os anões.
Assustaram-se ao ver Branca de Neve estirada e imóvel. O anão mais jovem
percebeu o cinto apertado demais e imediatamente o cortou. Branca de Neve
voltou a respirar e a cor, aos poucos, começou a voltar a sua face; melhorou e
pôde contar o ocorrido.
— Aquela velha vendedora ambulante era a rainha
disfarçada — disseram logo os anões. — Você não deveria tê-la deixado entrar.
Agora, seja mais prudente.
Enquanto isso, a perversa rainha, já no
castelo, consultava o espelho mágico e se surpreendeu ao ouvi-lo dizer:
— No bosque, na casa dos anões, minha querida
rainha, há Branca de Neve, mais bela que nunca.
Seu plano fracassara! Tentaria novamente.
No dia seguinte, Branca de Neve viu chegar
uma camponesa de aspecto gentil, que lhe colocou na janela uma apetitosa maçã,
sem dizer nada, apenas sorrindo um sorriso desdentado. A princesinha nem
suspeitou de que se tratava da madrasta, numa segunda tentativa.
Branca de Neve, ingênua e gulosa, mordeu a
maçã. Antes de engolir a primeira mordida, caiu imóvel.
Dessa vez, devia estar morta, pois o socorro
dado pelos anões, quando regressaram da mina, nada resolveu. Não acharam cinto
apertado, nem ferimento algum, apenas o corpo caído.
Branca de Neve parecia dormir; estava tão
linda que os bons anõezinhos não quiseram enterrá-la.
— Vamos construir um caixão de cristal para a
nossa Branca de Neve, assim poderemos admirá-la sempre.
O esquife de cristal foi construído e levado
ao topo da montanha. Na tampa, em dourado, escreveram: "Branca de Neve,
filha de rei".
Os anões guardavam o caixão dia e noite, e
também os animaizinhos da mata — veadinhos, esquilos e lebres — todos choravam
por Branca de Neve.
Lá no castelo, a malvada rainha interrogava o
espelho mágico:
— Espelho, espelho meu, diga-me se há no
mundo mulher mais bela do que eu.
A resposta era invariável.
— Em todo o mundo, não existe beleza maior.
Branca de Neve parecia dormir no caixão de cristal; o rosto branco como a neve
e de lábios vermelho como sangue, emoldurado pelos cabelos negros como ébano.
Continuava tão linda como enquanto vivia.
Um dia, um jovem príncipe que caçava por ali
passou no topo da montanha. Bastou ver o corpo de Branca de Neve para se
apaixonar, apesar de a donzela estar morta. Pediu permissão aos anões para
levar consigo o caixão de cristal.
Havia tanta paixão, tanta dor e tanto
desespero na voz do príncipe, que os anões ficaram comovidos e consentiram.
— Está bem. Nós o ajudaremos a transportá-la
para o vale. A donzela Branca de Neve será sua.
Com o caixão nas costas, puseram-se a
caminho. Enquanto desciam por um caminho íngreme, um anão tropeçou numa pedra e
quase caiu. Reequilibrou-se a tempo.
O abalo do caixão, porém, fez com que o
pedaço da maçã envenenada, que Branca de Neve trazia ainda na boca, caísse.
Assim a donzela se reanimou.
Abrindo os olhos e suspirando se sentou e,
admirada, quis saber:
— O que aconteceu? Onde estou?
O príncipe e os anões, felizes, explicaram
tudo.
O príncipe declarou-se a Branca de Neve e
pediu-a em casamento. Branca de Neve aceitou, felicíssima. Foram para o palácio
real, onde toda a corte os recebeu.
Foram distribuídos os convites para a
cerimônia nupcial. Entre os convidados estava a rainha madrasta — mas ela mal
sabia que a noiva era sua enteada.
Vestiu-se a megera suntuosamente, pôs muitas
joias e, antes de sair, interrogou o espelho mágico:
— Espelho, espelho meu, diga-me se há no
mundo mulher mais bela do que eu.
E o fiel espelho:
— No seu reino, a mais bela é você; mas a
noiva Branca de Neve é a mais bela do mundo.
Louca de raiva, a rainha saiu apressada para
a cerimônia. Lá chegando, ao ver Branca de Neve, sofreu um ataque: o coração
explodiu e o corpo estourou, tamanha era sua ira. Mas os festejos não cessaram
um só instante.
E os anões, convidados de honra, comeram,
cantaram e dançaram três dias e três noites. Depois, retornaram para sua
casinha e sua mina, no coração da mata.
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Fonte:
"Contos tradicionais, fábulas,
lendas e mitos": Ministério da Educação -
Fundescola - Projeto Nordeste -
Secretaria de Ensino Fundamental. Brasília, 2000 - Volume 2. (A imagem
que acompanha o texto, não se inclui na referida obra).
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