Era uma vez um homem casado; a mulher dizia
que morria por ele, e que Deus nunca dera a ninguém um marido assim. O homem
fiava-se naquelas palavras, e quando andava no campo a trabalhar dizia para o
criado:
— Não há ninguém que tenha uma mulher como a
minha.
O criado disse que não era bom experimentar,
porque podia ficar enganado. Disse o patrão:
— Agora é que desafio todo o mundo para me
mostrarem uma mulher melhor do que a minha.
— Pois eu estou pronto para uma experiência.
À noite, quando formos para casa, vai o patrão atravessado na palha fingindo
que morreu, e o resto fica por minha conta.
Assim aconteceu; o criado chegou mais tarde
do que o costume, bateu à porta, e com grande pranto contou como o patrão tinha
morrido de repente. Quando a mulher ia começar a fazer grandes choros,
disse-lhe o criado:
— Oh minha ama; é melhor não dar a saber isto
à vizinhança, porque se enche logo a casa de gente, e tudo quanto lhe vier
fazer companhia quer de comer e grandes esmolas, e assim nós dois podemos
passar a noite ao pé do corpo.
— Dizes bem, Valentim; pela manhã logo, se
dirá que morreu.
Pegaram ambos no corpo e foram deitá-lo em
cima de uma cama; passado algum tempo, diz o criado:
— Oh minha ama, a gente não ceia nada? isto
morto como morto, e vivo como vivo.
— Pois dizes bem, vou fazer folar e tu vai lá
abaixo buscar uma infusa de vinho.
Passado mais algum tempo, diz outra vez o
criado:
— Oh minha ama, deixe-me deitar um bocadinho
no seu colo, ando tão moído do trabalho.
— Pois sim, Valentim.
Tornou, depois o criado:
— O meu amo quando era vivo
Dizia-me que casasse contigo.
Respondeu a mulher:
— Também ele me dizia a mim
Que casasse contigo, meu Valentim.
O marido não quis esperar por mais para
certificar-se, e nunca mais fez caso dela em toda a sua vida.
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Ano de publicação: 1883
Origem: Portugal (Algarve)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba
Mendes (2021)
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