A LENDA DA ROSAS
As rosas atraíram desde a mais alta
antiguidade a atenção de todos os povos e por isso não é de estranhar o grande
número de lendas que correm a seu respeito.
Os egípcios tinham-nas em grande valor,
ornando-se com elas, uso que passou aos romanos e destes a todos os povos
modernos. Ainda não há muito que apareceram em vários túmulos egípcios restos
reconhecíveis de rosas.
Os Hindus dizem que o sol é uma rosa
vermelha, e os poetas antigos asseveram que as rosas eram todas brancas ao
princípio tomando a cor vermelha do sangue de Adônis, segundo uns, de Vênus,
segundo outros.
A Aurora era representada outrora sob a forma
de uma grinalda de rosas, a rosa deu o nome às festas da primavera (rusalija), a Virgem cristã que
substituiu no culto a Vênus antiga adotou como seu o mês das rosas e tem também
o nome de rosário o cordão
com contas, primitivamente composto com tratos da Rosa canina, com que as
mulheres piedosas marcam as suas rezas.
Os papas aproveitaram um fragmento do antigo
culto da rosa, dando anualmente na Páscoa uma rosa de ouro aos príncipes mais
religiosos da cristandade.
Na Idade Média, reminiscência sem dúvida do
costume das dissolutas da Roma antiga se ornarem de rosas na festa da Vênus
Ericina, condenavam as mulheres públicas, as raparigas desonradas e os judeus,
a trazerem como sinal distintivo uma rosa.
Os Romanos nos banquetes punham coroas de
rosas na cabeça e ornavam com elas as taças por onde bebiam em virtude de
crerem que estas belas flores preservavam da embriaguez.
A rosa foi não só símbolo da luz, do amor, da
voluptuosidade, mas também símbolo funerário. Nas lendas persas as rosas e os
ciprestes andam unidos; junto dos túmulos plantavam-se antigamente roseiras ao
lado dos ciprestes.
Segundo uma velha lenda irlandesa, quando um
doente vê uma rosa é sinal e morte.
Os Turcos dizem que a rosa nasceu do suor de
Maomé, os indianos fazem-na aparecer de um sorriso da voluptuosidade, segundo
Galliano é filha do orvalho, e a crer-se no que afirma Justin de Myeckow brotou
do suor de uma mulher chamada Jone, suor que por um fenômeno singular era
branco de manhã e vermelho ao meio dia. Daí as rosas brancas e as vermelhas.
Anacreonte ensina-nos que Cibele, para se
vingar de Vênus, criou a rosa com o fim de pôr em paralelo a beleza de Vênus
com a beleza da rosa.
Guillemeau diz que a rosa foi rainha e virgem
e conta assim a sua história:
“Existiu numa cidade da Grécia e reinou em
Corinto; a fama da sua beleza espalhou-se largamente por todas as cidades ainda
as mais distantes. A Acaia quis possuir esta ninfa proporcionando-lhe as mais
ilustres alianças.
O bravo Halésia colocou-se em primeiro lugar,
em seguida Briar, que se orgulhava em ser filho do céu, Arcas distinto dos
outros deuses por possuir dois pares de asas e por último o vencedor de Tebas
depôs também os seus louros aos pés da jovem princesa possuído dos sentimentos
afetivos de todos os outros adoradores. Mas a altiva beleza respondeu aos
amantes que a importunavam: Não é
fácil obter um coração como o meu, nem julgueis que vos é possível seduzir-me.
Quem me quiser há de vencer-me.
Disse, e com um andar altivo encaminhou-se para
o templo consagrado a Apolo e a Diana, seguida dos parentes e de todo o povo. A
ninfa aproximou-se do altar e invocou a deusa protetora da castidade. Nisto os
amantes furiosos despedaçaram as portas do templo e travou-se um combate
encarniçado; a jovem rainha sustentou o choque com firmeza, e defendeu-se com
tanto vigor que expulsou para longe os ferozes amantes, cujo procedimento pouco
delicado a ultrajava.
Quer que o pudor irritado desse novas graças
à beleza quer que a vitória a tornasse mais imponente, Rodante brilhava com um
esplendor tão divino que o povo deslumbrado exclamou em coro:
Que a bela Rodante seja de hoje para o
futuro a deusa deste templo. Tiremos Diana do altar.
A antiga deusa teve de ceder o lugar à nova,
mas Apolo indignado por este cumulo de audácia resolveu vingar o ultraje feito
à irmã e com um raio luminoso lançado obliquamente mostrou a aversão que tinha
a Rodante, e logo tudo mudou nela; os pés ligaram-se-lhes fortemente ao altar,
raízes alongaram-se e, privada repentinamente de todo o sentimento, ficou
imóvel, tornando-se-lhe duros os encantos vencedores. Os braços estenderam-se e
transformaram-se em ramos de árvores carregados de folhas. Já não é a bela
Rodante, a orgulhosa rainha, mas uma árvore.
Porém a metamorfose não a prejudicou, visto
que sob uma outra forma conservou a primitiva insensibilidade e a sua beleza
deslumbrante.
Toda a sua desgraça foi ser formosa, mais
formosa que Diana aos olhos dos adoradores que a amaram.
Quase logo o mesmo povo que tinha ultrajado
Diana, agitou-se e esforçou-se pô-la vingar.
Sepultam Rodante sob montões de espinhos que
em lugar de a prejudicar lhe serviram de defesa.
Os que doidamente a amavam foram também
metamorfoseados: Briar foi transformado em verme, Arcas em mosca, e Halésia em
borboleta, e sob esta forma vivem constantemente junto da ninfa cruel a quem a
metamorfose não mudou”.
O marquês de Cesnel dá-nos notícia da
seguinte lenda grega:
“Apesar de consagrada desde a mais tenra
infância ao culto de Diana, Rosália formou o projeto de desposar o belo
Cimedoro.
Mas não se afronta impunemente a cólera dos
Deuses. Apenas acabava de pronunciar aos pés do altar do himeneu os juramentos
sagrados, uma flecha despedida por Diana trespassou-lhe o coração. Cimedoro com
a cabeça perdida lança-se sobre o corpo da esposa, mas... oh prodígio! em lugar
das formas sedutoras da noiva só estreita de encontro ao peito um arbusto
coberto de espinhos e flores odoríferas que recebeu depois o nome da infeliz
Rosália”.
Abel Belmont, resume assim uma outra lenda que
lhe foi transmitida por Joseph Balmont:
“Era no tempo maravilhoso em que a Natureza
se afadigava em produzir em cada dia um novo ser.
Num alto monte, um arbusto estranho, sem
ramos e sem folhas, tinha brotado da terra, e ali permaneceu durante muitíssimos
anos sempre no mesmo estado.
Um dia porém uma mulher jovem e formosíssima,
tocando lira e cantando melodiosamente, aproximou-se da planta.
Ao ver um vegetal tão feio, condoeu-se e
afagou-o com a mão: apenas o vegetal se sentiu tocado, da extremidade semisseca
borbulhou seiva e brotaram pétalas macias como a mão que tocou o arbusto e
rosadas como as faces da formosa cantora.
Nenhuma flor na terra pôde depois para o
futuro ser comparada em beleza e perfume à deslumbrante rosa que Vênus fez
nascer”.
Ângelo de Gubernatis conta-nos da seguinte
forma a lenda da roseira brava:
“A rosa
canina passa na Alemanha por sinistra e diabólica.
Müllenhoff ouviu no Schleswig uma lenda em
que o diabo, caído do céu, afim de para ali tornar a subir procurou fazer uma
escada com os espinhos da roseira brava.
Deus em castigo do fato condenou o vegetal a
não poder elevar-se mas só ramificar-se para os lados; então, despeitado, o
diabo voltou-lhe para o solo a ponta dos espinhos.
Outros pretendem que a roseira brava, recebeu
esta maldição na ocasião em que nela se enforcou Judas, e é comemorando este
fato que ainda hoje chamam aos frutos, Judas-beeren (bagas de judas).
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Ano de publicação: 1892
Origem: Portugal
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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