Xisto e Tomás eram conterrâneos filhos da
mesma aldeia, uma aldeiazinha de Trás-os-Montes, em Portugal. Desde crianças,
sendo quase da mesma idade, eram íntimos amigos, e continuaram sempre na mesma
intimidade, depois de grandes, casados e pais de filhos, vindo até a serem
compadres.
Tão amigos eram, que resolveram embarcar para
o Brasil já que na aldeia não tinham esperanças de melhorar de estado, ao passo
que ouviam dizer que nos Brasis, floria a Árvore das Patacas. Era só a gente
subir aos galhos, e recolher moedas.
Assim um belo dia embarcaram no mesmo navio.
Sofreram iguais privações, juntos compartilharam as mesmas mágoas, as mesmas
saudades da Santa Terrinha, que deixaram, e das esposas, os filhos, os amigos,
o burro, mais a vaca, dois bezerritos, quatro leitões, e mais de dúzia e meia
de cabeças de criação.
Aqui, porém, a sorte mudou. Xisto enriqueceu
no comércio de escravos, e numa porção de negócios do mesmo gênero. Tomás, no
entanto, continuava pobre, e mais pobre se viu, depois que, à imitação do
compadre, mandara vir a mulher. A sua vida, por último, era um horror, e vendo
que não podia viver mais na cidade, onde tudo estava caríssimo, por preços
exorbitantes, resolveu-se a ir pedir ao comendador Xisto, que possuía léguas e
léguas de terras abandonadas, de todo incultas, alguns palmos de terreno, onde
pudesse construir uma casinha de morada, e cultivar alguns produtos de pequena
lavoura, que o sustentassem, mais a família, e que pudesse ir vender à vila.
Xisto, dessa vez mostrou-se compassivo e
generoso: cedeu ao seu compadre pobre, a terra que necessitava, e Tomás ali se
aboletou, numa choupana coberta de sapé, que edificou por suas próprias mãos.
As duas moradas eram vizinhas. De um lado,
via-se a miserável cabana de Tomás da Abadia, e do outro, a soberba e luxuosa
vivenda do “honrado comendador Xisto Manuel de Souza e Silva".
Certa vez, Tomás estava cavando a terra, e
Xisto se achava perto, gozando o prazer de não trabalhar, e ver o seu íntimo
amigo a mourejar como um escravo. De repente, a enxada de Tomás bateu num corpo
estranho, duro, resistente. Cavou mais, afundou o buraco, e eis que descobriu
uma panela cheia de moedas de ouro.
Como as terras lhe pertenciam, Xisto
apressou-se em levar o pote a casa, muito agitado, e não consentiu mais que o
compadre pobre trabalhasse em suas terras. Despediu o pobre Tomás, e chamou a
mulher para verem as riquezas que existiam em sua propriedade.
Abriram então a panela, mas encontraram
apenas uma casa de maribondos. Julgando que aquilo era caçoada de Tomás, o
milionário ficou possesso de raiva, e protestou que havia de lhe pregar uma
peça.
Apanhou a casa, colocou-se com muito jeito
num saco, para não alvoroçar os bichos, e dirigiu-se à casa de Tomás.
Assim que o avistou, foi logo gritando:
— Compadre, fecha as portas e deixa somente
um lado da janela aberto...
Tomás fez o que lhe dizia o outro.
Xisto chegando perto da janela, jogou para
dentro a casa de maribondos, dizendo:
— Fecha agora tudo, compadre, e toma este
presente que te trago.
Mas os maribondos assim que bateram no chão,
transformaram-se em moedinhas de ouro, e o pobre Tomás chamou a mulher e os
filhos para ajuntá-las.
Xisto gritava:
— Ó compadre, abre a porta!
— Deixa-me compadre Xisto, já não posso mais
com estes malditos bichos, que me matam de ferroadas, respondia o outro, que
compreendeu imediatamente o que havia sucedido, satisfeito por ver que Xisto
não conseguira fazer o mal que pretendera.
E o rico ria-se da boa peça que havia pregado
ao pobre.
Ficou assim o pobre rico, e o rico pobre, por
querer fazer maldade que não conseguiu.
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Ano de publicação: 1896.
Origem: Brasil (Reconto)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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