OS TRÊS CONSELHOS
Havia um homem que tinha muitos filhos, e tão pobre que não tinha que comer. Um dia despediu-se desapontado da mulher e dos filhos, e saiu dizendo que ia procurar meios de vida, e que só voltaria trazendo muito dinheiro. Depois de muitos anos, não tendo ele ainda encontrado meios de ganhar dinheiro e já muito saudoso da família, voltava este pobre homem para casa, quando apareceu-lhe um ricaço, e perguntou-lhe se ele queria ir trabalhar em sua casa, com a condição porém de só receber dinheiro depois de um ano trabalhado. No fim do ano o ricaço chegou-se a ele, e disse-lhe que o pagamento que tinha para dar-lhe era um conselho. O homem ficou muito triste, dizendo que não queria o conselho, e sim o seu dinheiro, que era com que ele ia sustentar sua família. O ricaço respondeu que aquele conselho valia mais do que dinheiro, e insistiu para ele aceitar, prometendo que no outro ano lhe pagaria melhor. Então deu-lhe o seguinte conselho:
— Nunca
deixes atalho por arrodeio.
O velho aceitou o conselho e continuou a
trabalhar. No fim do segundo ano, quando esperava receber algum dinheiro, vem
de novo o ricaço dando-lhe outro conselho. O velho desapontado disse-lhe que
não queria conselho, mas o ricaço convenceu-o de que não se arrependeria e que
aquele conselho lhe serviria mais do que dinheiro, e então disse-lhe que não se
hospedasse em casa de homem velho casado com mulher moça. O velho aceitou este
conselho e trabalhou mais um ano, no fim do qual o ricaço tornou a dar-lhe
outro conselho, que foi o seguinte:
— Hás
de ver três vezes pra creres.
E deu-lhe um pão, dizendo que ele só o
partisse quando estivesse em casa com a família. Despediu-se o velho levando os
três conselhos e o pão. No caminho, encontrou ele um atalho e um arrodeio.
Então lembrou-se do conselho que o ricaço tinha-lhe dado e seguiu pelo atalho.
Nisto apareceu um sujeito e lhe disse que a estrada que ia ter à casa dele era
outra, mas o velho não o ouviu e seguiu seu caminho. No fim do caminho encontra
ele o mesmo sujeito muito espantado, o qual disse-lhe ter encontrado no caminho
de onde veio um homem morto por muitos ladrões, tendo ele escapado por milagre.
O velho, ouvindo isto, compreendeu que tinha sido muito bom o conselho que o
ricaço tinha-lhe dado. Mais adiante, estando já muito cansado, chegou-se a uma
casa e pediu hospitalidade. O dono da casa acolheu-o muito bem, mas como era
velho e casado com uma mulher moça, lembrou-se ele do segundo conselho do
ricaço, e à noite, quando já todos dormiam, ele saiu e agasalhou-se debaixo de
um carro que ficava defronte da casa. Lá pela madrugada ele viu a mulher do
velho, onde ele tinha-se hospedado, abrir a porta e dirigir-se em companhia de
um frade para o carro. Aí chegando principiaram a conversar, e o velho ouviu da
mulher o seguinte:
— Hoje
podemos matar meu marido, porque temos um hóspede e eu digo que ele foi o
assassino.
O velho, que estava debaixo do carro ouvindo,
cortou com uma tesoura um pedaço da batina do frade, dizendo consigo que com
aquilo se defenderia. No dia seguinte muito cedo começou a mulher do velho a
gritar por socorro, dizendo que um hóspede tinha morto seu marido. Vem a
polícia e prende logo o velho, que estava debaixo do carro. Na ocasião de ser
condenado à forca, pediu ele que queria se confessar com o padre Fulano, o tal
que ele tinha cortado a batina. Vindo o padre, o velho declarou que a confissão
que tinha a fazer era que aquele padre é que tinha assassinado o homem e para
prova mostrou o pedaço da batina, reconhecendo todos ser verdadeira aquela e
sendo ele imediatamente solto e o padre condenado. Mais uma vez viu o velho que
o conselho do ricaço lhe serviu mais do que dinheiro. Continuou a sua viagem,
chegando perto de sua casa já de noite. Vendo que estava fechada, espiou pela
fechadura e viu sua mulher muito alegre conversando com um moço. Ele armou logo
a espingarda para atirar em ambos, mas lembrou-se o do conselho do ricaço,
deixou a espingarda e espiou de novo. Vendo-os ainda na mesma alegria, pegou de
novo na espingarda e ia atirar, quando lembrou-se de novo do conselho do ricaço
e então quis ver e ouvir mais uma vez. Então ouviu a mulher dizer a uma negra
que deitasse um banho para seu filho, que tinha chegado muito cansado. Aí o
velho lembrou-se que quando saiu de casa tinha deixado a mulher grávida e com
efeito aquele moço era seu filho, que já era padre e tinha vindo do seminário
naquele dia. O velho bateu na porta e a mulher recebeu-o com alegria, pois já o
julgava morto. Os filhos também o receberam com satisfação e, depois de muito
conversarem, disse-lhes o velho que nada tinha arranjado, trazendo somente no
baú um pão que um homem tinha-lhe dado, para ele só o abrir quando estivesse em
casa com a família. Partiram então o pão, e ainda mais alegres ficaram, quando
viram cair do mesmo uma quantidade enorme de moedas de ouro.
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