Seguiram. Vendo umas bananeiras logo adiante, a onça propôs:
— Amigo veado, vamos comer bananas. Você sobe e pega as verdes, que são as melhores, e me atira as amarelas, que não valem nada.
O veado subiu, jogou as amarelas para a onça e ficou com as verdes, que não pôde comer. Desceu com o estômago no fundo, enquanto a onça arrotava de gosto.
Seguiram. Adiante encontraram uns trabalhadores capinando a roça.
A onça disse:
— Amigo veado, quem passa junto daqueles homens deve dizer: "Que o diabo os carregue!" É uma saudação que deixa os homens contentíssimos.
O bobo do veado foi e disse aos trabalhadores: "Que o diabo os carregue!" mas os homens, furiosos, soltaram-lhe os cachorros em cima e quase o pegaram. Já a onça ao passar por eles, o que disse foi: "Deus ajude a quem trabalha!" E os homens, muito satisfeitos com a frase, deixaram-na passar sossegadamente.
Adiante a onça viu uma cobrinha coral.
— Olhe, amigo veado, que lindo colar vermelho. Leve-o para pôr no pescoço de sua filha.
Assim que o veado foi pegar aquilo, a cobra deu-lhe um bote, que por um triz o não alcançou.
Finalmente chegaram à casa do compadre. Era quase noite, de modo que depois duma prosinha trataram de dormir. O veado armou uma rede a um canto e logo ferrou no sono. A onça, então, foi pé ante pé ao curral, comeu uma ovelha e trouxe uma cuia de sangue, que derramou em cima do veado. Depois deitou-se e dormiu regaladamente.
De manhã o compadre foi ao curral e percebeu que lhe haviam comido uma ovelha. Desconfiou logo da onça.
— Eu, comer sua ovelha, compadre?
Que ideia! Olhe como estou sem o menor sinal de sangue. Talvez fosse o veado... O compadre olhou para o veado e o viu todo sujo de sangue.
— Ah, ladrão! — e deu-lhe de cacete até matar.
A onça despediu-se do compadre e lá se foi, muito lampeira.
Dias depois convidou o macaco para outra visita ao compadre. O macaco aceitou. Foram. No ribeirão a onça veio com a mesma história:
— Passe sem medo, macaco. A água é rasinha.
Mas o macaco, que tinha sabido da história do veado, não foi na onda.
— Nada! — disse ele. — Passe você primeiro, para eu ver se a água é mesmo rasinha como diz — e a onça não teve remédio senão passar na frente.
Lá nas bananeiras o macaco subiu, mas comeu todas as amarelas e à onça só deu as verdes. Furiosa do logro, a onça foi pensando: "Ah, bicho duma figa! Eu ainda acabo lanhando esse lombo com as minhas unhas!"
Quando chegaram à roça dos trabalhadores, a onça avisou:
— Escute, macaco. A saudação que esses homens gostam é assim: "O diabo leve quem trabalha!" — mas ao passar por eles o macaco disse coisa diversa: "Deus ajude a quem trabalha!" — e os homens, deixaram-no passar.
Quando encontraram a cobrinha e a onça lembrou que era um ótimo colar para a mulher do macaco, este respondeu:
— Está me parecendo muito melhor para pulseira de uma filha de onça! — e não quis saber de pôr a mão na cobra.
Chegaram por fim à casa do compadre. Depois duma prosinha foram deitar-se. O macaco, sabidão, armou sua rede bem alto; deitou-se e fingiu dormir. A onça foi ao curral e comeu outra ovelha, vindo com a cuia de sangue lambuzar o macaco. Mas este arrumou com o pé na cuia, de modo que o sangue caiu em cima da onça.
Indo pela manhã ao curral, o compadre deu pela falta da ovelha.
— Que coisa esquisita! Sempre que a onça vem cá, desaparece-me uma ovelha...
E foi para casa, furioso da vida. Deu com a onça roncando — fingindo que dormia, mas lá do alto de sua rede o macaco apontava para ela, dizendo:
— Veja como está barreadinha de sangue.
— Desta vez me paga! — gritou o compadre, e
apontando a espingarda, pum! —
matou a onça.
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Ano de
publicação: 1922.
Pesquisa
e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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