Uma vez um homem tinha três filhos. Cada um
por sua vez saiu para ganhar a sua vida, indo primeiro o mais velho e ao depois
os outros dois. O primeiro tinha um pé de laranjeira e disse:
— Quando
o meu pé de laranjeira começar a murchar, me acudam, que eu estou em perigo.
Ele ganhou o mundo e foi dar na casa de uma
princesa, que tinha duas irmãs parecidas com ela. Lá chegando, pediu rancho e
lhe foi dado; mas na hora da ceia a moça pegou com ele uma aposta, dizendo que
quem comesse mais seria senhor do outro. O moço concordou e puseram-se na mesa.
A moça comeu muito e, quando não pôde mais, pediu licença para ir lá dentro, e
mandou uma de suas irmãs a substituir. Esta veio e começou a comer, e o moço,
que a não tinha visto, a tomou pela primeira. Afinal ele não pôde mais e
arriou, e ficou por cativo. Lá em sua casa entrou a murchar o seu pé de
laranjeira, e o irmão do meio foi ao pai e disse:
— Meu
pai, meu irmão mais velho está em perigo e eu quero ir em socorro dele.
— Pois bem, vai; mas tu o que queres
— minha
maldição com muito dinheiro, ou minha bênção com pouco?
— A maldição com muito.
O moço partiu, e, ao sair, disse:
— Quando
o meu pé de limeira começar a murchar me acudam que eu estou em perigo.
Saiu e andou muito. Foi ter justamente em casa
da princesa onde se achava preso o seu irmão. Lá pediu rancho, e na hora da
janta lhe aconteceu o mesmo que ao outro, ficou também preso, mas não sabia um
do outro. Lá em sua casa entrou a murchar o seu pé de limeira. O irmão caçula
foi ao pai e pediu para ir em procura de seus dois irmãos. O pai fez a pergunta
que havia feito ao outro, e ele respondeu pedindo a bênção. Seguiu Chico
Ramela, assim era o seu nome, adiante encontrou uma velhinha que era Nossa
Senhora, a sua madrinha, que lhe ensinou onde estavam seus irmãos, e o que
costumava a princesa fazer para prender a quem lá ia, e disse que ele aceitasse
a aposta, mas não deixando a moça se levantar da mesa. Lá chegando, ele
executou tudo o que a velhinha lhe aconselhou e ganhou a aposta; mas não quis a
princesa por sua cativa, se contentando em soltar todos os presos que lá se
achavam. Os irmãos ficaram muito satisfeitos e seguiram todos três juntos.
Mais adiante os dois mais velhos se
revoltaram contra o caçula e lhe fizeram a traição de lhe tomarem tudo que
levava e o cativarem. Compraram cavalos e seguiram levando a Chico Ramela por
escravo. Foram dar num reino onde uns bichos ferozes vinham todas as noites
estragar e devorar as hortas e jardins do rei, e não havia quem pudesse dar
cabo deles. Os dois irmãos de Chico Ramela se foram oferecer para matar os tais
animais, e nada puderam fazer. Afinal o Chico foi-se oferecer e foi aceito. Foi
dormir nas hortas do rei, munido de uma viola, que pôs-se a tocar para não
pegar no sono. Lá pela terça noite ele ouviu aquele zoadão que vinha acabando
tudo. Eram os animais ferozes. Eram três cavalos encantados. Chegaram às hortas
do rei e não puderam entrar porque o moço se apresentou em frente deles. Cada
um pediu por sua vez uma folha de couve, que o moço deu. Então o primeiro
cavalo disse:
— Quando
se achar em algum perigo, diga:
— Valha-me
o meu cavalo baio encerado das crinas pretas.
E partiu. O outro disse:
— Quando
se ache nalgum perigo, diga: "Valha-me o meu cavalo lazão da estrela
branca."
Partiu. O terceiro disse:
— Quando
se achar nalgum perigo diga: ‘Valha-me o meu cavalo ruço-pombo das canas
pretas.
E sumiu-se. No dia seguinte apareceram os
jardins e hortas do rei perfeitinhos, e Chico Ramela com muito dinheiro e seus
irmãos fugidos e corridos de vergonha.
Tempos depois, a filha do rei declarou que só
se casava com o moço que, montado a cavalo, em toda a desfilada, subisse as
sete escadarias do palácio e lhe tirasse o cravo que ela tinha no cabelo.
Marcou-se o dia para esta cerimônia e nenhum pôde conseguir lá chegar. Então
Chico Ramela disse:
— Valha-me
o meu cavalo baio encerado das crinas pretas.
De repente lhe apareceu aquele cavalo todo
arreado de prata que fazia inveja a todos, e ele partiu a toda a bride.
Chegando a palácio o cavalo galgou três escadarias e voltou. Todos ficaram
muito admirados porque foi o cavalo mais bonito que apareceu e o cavaleiro que
chegou mais alto. No dia seguinte também ninguém nada conseguiu, e Chico Ramela
disse:
— Valha-me
o meu cavalo lazão da estrela branca!
Apareceu o cavalo todo arreado de ouro e o
moço partiu. Galgou cinco escadarias e voltou. Todos ficaram ainda mais
espantados e a princesa já se sentia apaixonada. No terceiro dia a mesma coisa,
e ninguém conseguiu chegar onde estava a princesa. Então Chico Ramela disse:
— Valha-me
o meu cavalo ruço-pombo das canas pretas!
Apareceu aquele cavalo lindo de fazer medo,
todo arreado de diamantes. Houve bravos gerais; o moço passou pela princesa em
toda a desfilada, o cavalo trepou as sete escadarias, fez uma mesura, e o moço
tirou o cravo dos cabelos da moça. Teve lugar o casamento; houve muitas festas,
e os irmãos do Chico desapareceram envergonhados.
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Ano de publicação: 1883
Origem: Sergipe (Brasil)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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