A ONÇA, O VEADO E O MACACO
Uma vez, amiga onça convidou amigo veado para
ir comer leite em casa de um compadre, e amigo veado aceitou. No caminho tinham
de passar um riacho, e a onça enganou o veado, dizendo que ele era muito raso,
e não tivesse medo. O veado meteu o peito e quase morreu afogado. A onça passou
por um lugar mais raso e não teve nada. Seguiram. Adiante encontraram umas
bananeiras, e a onça disse ao veado:
— Amigo
veado, vamos comer bananas; você suba, coma as verdes, que são as melhores, e
me atire as maduras.
Assim fez amigo veado, e não pôde comer
nenhuma, e a onça encheu a pança. Seguiram; adiante encontraram uns
trabalhadores capinando uma roça. A onça disse ao veado:
— Amigo
veado, quem passa por aqueles trabalhadores deve dizer: "Diabo leve a quem
trabalha."
Assim foi; quando o veado passou pelos homens
gritou:
— Diabo
leve a quem trabalha!
Os trabalhadores largaram-lhe os cachorros, e
quase o pegaram. A onça, quando passou, disse:
— Deus
ajude a quem trabalha.
Os homens gostaram daquilo, e a deixaram
passar. Adiante encontraram uma cobrinha de coral, e a onça disse:
— Amigo
veado, olhe que linda pulseira para você levar à sua filha!
O veado foi apanhar a cobra, e levou uma
dentada; pôs-se a queixar-se da onça, e ela lhe respondeu:
— Quem
manda você ser tolo?
Afinal chegaram à casa do compadre da onça;
já era tarde e foram dormir. O veado armou sua redinha num canto e ferrou no
sono. Alta noite, a onça se levantou devagarzinho de pontinha de pé, abriu a
porta, foi ao curral das ovelhas, sangrou uma das mais gordas, aparou o sangue
numa cuia, comeu a carne, voltou para casa, largou a cuia de sangue em cima do
veado para o sujar, e foi-se deitar. Quando foi de manhã o dono da casa se
alevantou, foi ao curral e achou uma ovelha de menos. Foi ver se tinha sido a
onça, e ela lhe respondeu:
— Eu
não, meu compadre, só se foi amigo veado, veja bem que eu estou limpa.
O homem foi à rede do veado e achou-o todo
sujo de sangue.
— Ah!
Foi você, seu ladrão!
Meteu-lhe o cacete até o matar. A onça comeu
bastante leite e foi-se embora.
Passados tempos, ela tomou um capote
emprestado ao macaco e o convidou para ir comer leite em casa do mesmo
compadre. O macaco aceitou e partiram. Chegando adiante, encontraram o riacho,
e a onça disse:
— Amigo
macaco, o riacho é raso, e você passe adiante e por ali.
O macaco respondeu:
— Ah!
Você pensa que eu sou como o veado que você enganou? Passe adiante se quiser,
senão eu volto...
A onça, que viu isto, passou adiante. Quando
chegaram nas bananeiras, ela disse:
— Amigo
macaco, vamos comer bananas; você coma as verdes, que são as melhores, e me
atire as maduras.
— Vamos — disse o macaco, e foi logo se
atrepando. Comeu as maduras e atirou as verdes para a onça. Ela ficou
desesperada, e dizia:
— Amigo
macaco, amigo macaco!... Eu te boto a unha!...
— Eu vou-me embora se você pega com
histórias.
Assim respondia o macaco e foram seguindo.
Quando passaram pelos trabalhadores a onça disse:
— Amigo
macaco, quem passa por aqueles homens deve dizer:
— Diabo
leve a quem trabalha; porque ali eles estão obrigados.
O macaco, quando passou, disse:
— Deus
ajude a quem trabalha.
Os trabalhadores ficaram satisfeitos, e o
deixaram passar. A onça passou também. Adiante avistou uma cobrinha de coral, e
disse ao macaco:
— Olhe,
amigo, que lindo colar para sua filha! Apanhe e leve.
— Pegue você — e não quis o macaco pegar.
Afinal chegaram à casa do compadre da onça e
foram-se deitar porque já era tarde. O macaco, de sabido, armou sua rede bem
alto, deitou-se e fingiu que estava dormindo. A onça, bem tarde, saiu de
pontinha de pé, foi ao chiqueiro das ovelhas, sangrou a mais bonita, comeu a
carne, e foi com a cuia de sangue para derramar no macaco. Ele, que estava
vendo tudo, deu-lhe com o pé, e o sangue caiu todo em riba da onça. Quando foi
de para manhã, o dono da casa foi ao curral, e achou uma ovelha de menos, e disse:
— Sempre
que a malvada desta comadre dorme aqui, falta-me uma criação!
Largou-se para casa, e já encontrou o macaco
de pé e apontando para a onça, que fingia que estava dormindo. O homem a viu
toda suja de sangue, e disse:
— Ah,
é você, sua diaba!
Deu-lhe um tiro e a matou. O macaco comeu
muito leite, e foi-se embora muito satisfeito.
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