Uma vez havia um pai que tinha três filhos,
e, não tendo outra coisa que lhes dar, deu a cada um uma melancia, quando eles
quiseram sair de casa para ganhar a sua vida. O pai lhes tinha recomendado que
não abrissem as frutas senão em lugar onde houvesse água. O mais velho dos
moços quando foi ver o que dava a sua sina, estando ainda perto da casa, não se
conteve e abriu a sua melancia. Pulou de dentro uma moça muito bonita dizendo:
— Dai-me
água, ou dai-me leite.
O rapaz não achava nem uma coisa nem outra, a
moça caiu para trás e morreu.
O irmão do meio, quando chegou a sua vez, se
achando não muito longe de casa, abriu também a sua melancia, e saiu de dentro
uma moça ainda mais bonita do que a outra; pediu água ou leite, e o rapaz não
achando nem uma coisa nem outra, ela caiu para traz e morreu.
Quando o caçula partiu para ganhar a sua vida
foi mais esperto e só abriu a sua melancia perto de uma fonte. No abri-la pulou
de dentro uma moça ainda mais bonita do que as duas primeiras, e foi dizendo:
— Quero
água ou leite.
O moço foi à fonte, trouxe água e ela bebeu a
se fartar. Mas a moça estava nua, e então o rapaz disse a ela que subisse num
pé de árvore que havia ali perto da fonte, enquanto ele ia buscar a roupa para
ela. A moça subiu e se escondeu nas ramagens. Veio uma moura torta buscar água,
e, vendo na água o retrato de uma moça tão bonita, pensou que fosse o seu e
pôs-se a dizer:
— Que
desaforo! Pois eu, sendo uma moça tão bonita, andar carregando água!...
Atirou com o pote no chão e arrebentou-o.
Chegando em casa sem água e nem pote levou um repelão muito forte, e a senhora
mandou-a buscar água outra vez; mas na fonte fez o mesmo, e quebrou o outro
pote. Terceira vez fez o mesmo, e a moça não se podendo conter deu uma
gargalhada.
A moura torta, espantada, olhou para cima e disse:
— Ah!
É você, minha netinha!... Deixe eu lhe catar um piolho.
E foi logo trepando pela árvore arriba, e foi
catar a cabeça da moça. Fincou-lhe um alfinete, e a moça virou numa pombinha e
avoou! A moura torta então ficou no lugar dela. O moço, quando chegou, achou
aquela mudança tamanha e estranhou; mas a moura torta lhe disse:
— O
que quer? Foi o sol que me queimou!... Você custou tanto a vir me buscar!
Partiram para o palácio, aonde se casou. A
pombinha então costumava avoar por perto do palácio, e se punha no jardim a dizer:
— Jardineiro,
jardineiro, como vai rei, meu senhor, com a sua moura torta?
E fugia. Até que o jardineiro contou ao rei,
que, meio desconfiado, mandou armar um laço de diamante para prendê-la, mas a
pombinha não caiu. Mandou armar um de ouro, e nada; um de prata, e nada; afinal
um de visco, e ela caiu. Foram levá-la que muito a apreciou. Passados tempos, a
moura torta fingiu-se pejada e pôs matos abaixo para comer a pombinha. No dia
em que deviam botá-la na panela, o rei, com pena, se pôs a catá-la, e
encontrou-lhe aquele carocinho na cabecinha, e pensando ser uma pulga, foi
puxando e saiu o alfinete e pulou lá aquela moça linda como os amores. O rei
conheceu a sua bela princesa. Casaram-se, e a moura torta morreu amarrada nos
rabos de dois burros bravos, lascada pelo meio.
Ano de publicação: 1883
Origem: Pernambuco (Brasil)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)
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