— Sou fidalga! — dizia a mosca à formiguinha
que passava carregando uma folha de roseira. Não trabalho, pouso em todas as
mesas, lambisco de todos os manjares, passeio sobre o colo das donzelas — e até
me sento no nariz. Que vidão regalado o meu...
A formiguinha arriou a carga, enxugou a testa
e disse:
— Apesar de tudo, não invejo a sorte das
moscas. São mal vistas. Ninguém as estima. Toda gente as enxota com asco. E o
pior é que têm um berço degradante: nascem nas esterqueiras.
— Ora, ora! — exclamou a mosca. Viva eu
quente e ria-se a gente.
— E além de imundas são cínicas — continuou a
formiga. Não passam dumas parasitas — e parasita é sinônimo de ladrão. Já a mim
todos me respeitam. Sou rica pelo meu trabalho, tenho casa própria onde nada me
falta durante o rigor do mau tempo. E você? Você, basta que fechem a porta da
cozinha e já está sem o que comer. Não troco a minha honesta vida de operária
pela vida dourada dos filantes.
— Quem desdenha quer comprar — murmurou
ironicamente a mosca.
Dias depois a formiga encontrou a mosca a
debater-se numa vidraça.
— Então, fidalga, que é isso? —
perguntou-lhe.
A prisioneira respondeu, muito aflita:
— Os donos da casa partiram de viagem e me
deixaram trancada aqui. Estou, morrendo de fome e já exausta de tanto me
debater.
A formiga repetiu as empáfias da mosca, imitando-lhe a voz: “Sou fidalga! Pouso em todas as mesas... Passeio pelo colo das donzelas...” e lá seguiu o seu caminho, apressadinha como sempre.
Quem quer colher, planta. E quem do
alheio vive, um dia se engasga.
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