quinta-feira, 25 de novembro de 2021

A história dos macacos (Fábula), de Monteiro Lobato

 

A HISTÓRIA DOS MACACOS
 

Antigamente, lá no começo do mundo, os macacos moravam com os homens nas cidades. Falavam como eles, mas não trabalhavam. 

Certa vez houve uma grande festa. Durante um dia e uma noite o tantã não parou de soar. Todos dançavam e bebiam um vinho feito de caldo de palmeira, porque ainda não era conhecida a uva. O velho chefe da tribo saiu dali cambaleando e foi parar no bairro dos macacos. 

Antes não fosse! Os macacos judiaram dele. Uns puxavam-lhe a tanga, outros punham-lhe a língua, outros beliscavam-lhe a pele. Tamanha foi a falta de respeito que o velho chefe enfureceu-se a ponto de queixar-se a Nzame, a divindade da tribo. 

Nzame mandou chamar o chefe dos macacos. Passou-lhe uma grande descompostura e disse: 

— De hoje em diante, como castigo, os macacos têm que trabalhar para os homens. 

Mas os macacos revoltaram-se contra a ordem do deus. Juraram não trabalhar. Quando iam para a roça, penduravam-se nas árvores do caminho, davam pulos pra aqui, pra ali, fugiam. Não houve meio de conseguir deles nenhum trabalho. O chefe da tribo danou. 

— Preciso dar uma lição nesta macacada. 

Depois de refletir algum tempo deu ordens, para uma grande festança, onde houvesse muito vinho. Mas dividiu as cabaças de vinho em dois lotes — um de vinho puro e outro de vinho misturado com uma erva dormideira. "Este é para os macacos" disse ele. 

Quando os macacos souberam da grande festa e da grande vinhaça, aproximaram-se todos muito xeretas. Dançaram, pularam e beberam até não poder mais. Meia hora depois dormiam sono profundo. 

O chefe, então, mandou que os seus homens metessem o chicote nos macacos até deixá-los peladinhos — e no dia seguinte botou-os no serviço. 

Mas quem pode com macaco? — O berreiro que fizeram foi tamanho que o chefe, completamente zonzo, deu ordem para que lhes cortassem a língua. "É o único meio de acabar com esta gritaria." 

Ficaram os macacos sem línguas — mas dois dias depois sumiram-se da aldeia, afundando no mato. Nunca mais quiseram saber dos homens — e também nunca mais falaram. Quem tem língua cortada não fala.

 

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Ano de publicação: 1937.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2021)

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